26 julho 2012

Prazer, transformista

Dieison Marconi

Dei sim, dei tudo só pra ele. Hoje, por grana, pra todos. Não roubo, não mato. Mesmo assim me pergunto se não faço algo de errado." (Francisco Alvim)  
Michês?  Amantes anônimos?  Transformistas? Prostitutos ou homossexuais a procura de sexo fácil em uma pequena cidade do interior do Rio Grande do Sul?  Em Frederico Westphalen, região do Médio Alto Uruguai, todos já ouviram falar das “bichas do centro” diz um menino sentado em minha frente, falando e rindo  para  um gravador,  mas que prefere ser chamado de Vitória quando sai nas  noites frederiquenses pra conseguir sexo.  Além dele, há outros, entre adolescentes e adultos, que costumam  fazer o mesmo:  travestidos de mulher, saem batendo salto alto atrás de uma companhia  pra noite, ou somente pra transar, pra conseguir dinheiro, ou  tudo ao mesmo tempo, pois segundo eles, é difícil para um gay  conseguir sexo em uma cidade pequena e interiorana como Frederico Westphalen, e assim,  recorrem  a prostituição para suprir esse desejo.
Saem em  dupla, em grupo ou raramente sozinhos, principalmente nas sextas, sábados e quando há alguma festa que provoque um grande movimento na cidade.  Saem sempre por volta das 12:00  da  noite, primeiro no centro, na Rua do Comércio. Após isso, vão para as esquinas ou para os locais onde há mais movimento devido as festas,  sempre procurando ficar mais visível  aos clientes, pra que estes possam chegar até eles sem serem notados por outras pessoas. O preço do programa varia: da mesma forma como podem conseguir 120 reais em uma noite com um único cliente, podem fazer de graça: basta o cliente ser bonito.

Fazemos programa mais pra dar um ar de mulher, né. Não por “precisão. Mais por boa vontade” (Kelli, 22 anos) 
Não se dizem profissionais do sexo e não saem todos os finais de semana.  Alguns fazem por dinheiro só quando precisam, quando julgam o cliente  feio ou  quando o mesmo tem a idade um pouco ultrapassada. Além disso, boa parte deles costumam trabalhar durante o dia em bares, lojas, restaurantes, como atendentes e garçons: o programa é pra conseguir prazer e sexo.  Muitos começaram a prostituir-se ainda na menor idade, geralmente influenciados por outros que já faziam programa.  Segundo Vitória, Lety foi o primeiro gay assumido e o primeiro transformista na cidade. Foi ele quem ensinou os outros gays a se prostituirem, no fim, todo mundo gostou,  e  criou-se o grupo.
Foi Lety também que batizou seus pupilos com nomes femininos: Vitória, Kelly Gisele, Samanta, Tina, Tainá.   Durante a noite, enquanto  estão tentando programa, atendem  apenas por estes nomes. Dizem não fazer programa com outros gays e nas relações sexuais são sempre passivos, a não ser que e o programa seja por dinheiro. Além do nome, travestir-se de mulher é importante pra  conseguir o programa de cada noite, pois os  clientes preferem assim: eles caem em uma fantasia tanto por parte dos clientes, que dizem ser “heterossexuais”, mas que gostam de transar com homens,  principalmente se estes estiverem vestidos de mulher, assim como por parte de  Kelli, por exemplo, que se  diz mulher usando roupas femininas, mas que não mudaria de sexo.  Já Gisele, um dos meninos mais novos do grupo, não queria nem  ter nascido homem. 

Por dinheiro eu acabo sendo ativa né, fazer o quê! Eles querem tudo da gente.” (Vitória, 16 anos.)
  A mãe de Vitória  sabe que ele se prostitui.  Os colegas da escola sabem apenas que ele é gay. Mas pra mãe, ele já contou algumas vezes que conseguiu dinheiro dessa forma, embora ela não goste.  O Pai de Gisele também sabe que ele faz programas, mas evitam conversar sobre isso.  Já Kelli, o mais velho, seus pais sabem e não veem nenhum problema nisso. Kelli diz que fez fama: todos sabem que ele faz programa, inclusive alguns chefes dos locais onde trabalhou.  Vai em lojas e compra roupas femininas, sapatos, maquiagem, bolsas e as vendedoras são suas amigas, sabem o que ele faz.   
Já Eduard não se prostitui como seus colegas, pelo contrário: apesar de não recriminar quem o faça, como opção individual abomina a prostituição. Veste-se de mulher apenas pra conquistar os homens e conseguir sexo, mas sem prostituir-se: “Eu detesto essa condição. Essa é uma condição que faço pra poder atrair os homens heterossexuais, o perfil de homem pelo qual eu sinto uma atração fatal.”  O perfil destes homens varia: de jovens a adultos, de solteiros a casados.

Assim, num jogo de sedução e prostituição feito pelas ruas de uma cidade interiorana, conservadora e católica, Gisele, Eduard, Kelli, Vitória são homens e meninos que se metamorfoseiam a partir da meia noite, “transforma-se” em mulheres por motivos diferentes e estão mergulhados em uma confusão ideológica do que é ou não ser gay, de desejos de se transformar em mulher, mas não abrir mão de ser homem, ou de ser homem, mas querer ser uma mulher, ou ainda: de travestir-se de mulher e ao mesmo tempo detestar isso.   

A vida me ensinou que se os homens não vem atrás da gente, a gente tem que ir atrás deles"  (Gisele) 

*Um dos textos (texto de apresentação) que fiz para uma reportagem multimídia sobre prostituição masculina com suas particularidades do interior.

13 comentários:

  1. Não julgo nem condeno quem "aluga" seu corpo, até pq cada um sabe o que faz da sua vida, e deve saber que esse é um tipo de profissão com muitos riscos e que nem sempre vale a pena...
    bom textos :)

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  2. Parabéns Dieison Marconi ... vc mandou muito bem neste post ... um verdadeiro tratado ...

    bjão

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  3. Muito bom o texto, um assunto bem pertinente para ser discutido.
    Abrços

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  4. Ótimo texto, uma assunto que se põe tantos idéias e visões diferentes, mas o respeito é sempre buscado para todos, e são tantos os fatores que podem influenciar a alguém a se prostituir e isso se consiste no trajeto de vida de cada um e com suas próprias idéias. Com certeza é uma profissão que tem seus riscos.
    Abraços!

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  5. pois é, para todo mundo ver como esse mundo é diverso. dentro do mundinho deles, eles aprenderam que ser gay é assim e ficam repetindo o modelo que aprenderam.

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  6. Realmente não podemos julgá-los porque cada um busca o que busca devido as escolhas que faz, então o importante é eles se sentirem bem e a vontade de viverem suas sexualidades sem conflitos e grandes dramas.

    Abraços.

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  7. Muito bom o texto e esclarecedor em vários sentidos.
    Cada um à sua maneira busca o que acha que precisa...
    Abraços

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  8. Adorei o texto! nunca busquei sexo casual até pq acho que o sexo é o complemento de uma relação! Acho que cada um sabe o que quer ou pelo menos pensa que sabe! me lembro que me Ex depois de transarmos no dia do nosso niver de namoro me deu um presente que fiquei puto! um envelope com dinheiro e escrito assim "Não sabia oque comprar, mais sei que você saberá" na boa me senti um GP naquela hora e eu tinha comprado um par de novas alianças rs! curti mto seu texto!

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  9. What? ahuahauhauhauhauha
    gente bem que poderia ter uma cidade dessas aqui pertinho do centro de sampa, né? rs!

    http://the-paperboy.blogspot.com.br/

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  10. Cada um procura aquilo que mais o satisfaz... Excelente post!

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  11. Frederico Westphalen!Até o nome da cidade é gay a beça!

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  12. O texto traz uma ótima reflexão. Respeitar que cada um é o que é, o que escolhe ser, ou o que consegue ser.. muito bom!

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  13. Não comentei antes, mas achei este texto fantástico! Cativou-me como leitor deste blog, com certeza!

    Abração!

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